terça-feira, 16 de julho de 2013

Capítulo 8 - A gota d'água

Foi assim: o Jorge saiu para deixar o Caio e a Anna na escola. Era uma segunda-feira, eu estava atrasada e, quando ele voltou, eu ainda estava em casa.
Ele me olhou sério, os olhos molhados e disse: "Não dá mais. Se você disser que sim, peço as contas agora e fico com as crianças".
Fiquei confusa, perguntei o que havia acontecido.
Ele narrou o de sempre: a professora queria fazer terrorismo com o Caio porque ele não comia bem, reclamou que ele chegava cambaleando, a professora da Anna pegou-a como mais um pacotinho... Só que o problema é que nós já estávamos conversando sobre tudo isso. Já tínhamos aberto os olhos para "além" das convenções da nossa sociedade. Ele chorou. Eu chorei.
O que estávamos fazendo? O que estávamos fazendo com nossos filhos? Se eles eram nossos bens mais preciosos, por que trabalhávamos tanto? Para quem trabalhávamos tanto se os deixávamos com outros? Por que os deixávamos com pessoas que tinham valores diferentes dos nossos?
Nada disso fazia sentido, claro! E começamos a traçar nossos planos.
Caio e Anna sairiam da escola. E o Igor? Bem, sentamos umas três vezes para decidir o que fosse melhor para ele e para a família. Vimos que não teria sentido experimentarmos a desescolarização (sim, era isso que queríamos experimentar) sem a companhia do Igor.
Sentei com ele e fiz a seguinte proposta: um ano e meio sem escola para "desintoxicar" (rs) e então ele poderia decidir se gostaria de voltar à escola ou não.
Ele ficou meio receoso, mas eu disse e reafirmei e ainda hoje repito: "se não ficar bom para qualquer um de nós, a gente senta, conversa e, se for o caso, experimenta outro caminho, até mesmo o voltar atrás".
Tudo decidido! Jorge pediu as contas para ficar com as crianças, colocamos o apartamento à venda para nos livrarmos da amarra das prestações e, agora sim, o blog vai começar com nossas tentativas e erros nesse processo de nos desescolarizarmos...

4 comentários:

  1. Mãe maluca da Pê (segundo algumas tias: mãe desnaturada)gostaria muito, mas muito mesmo jogar para o alto os 4 anos que faltam para minha aposentadoria como professora e brincar de ser vovó. Daquelas que larga toda as tarefas domésticas pra sentar e contar uma história pros netos, uma história qualquer, inventada ao gosto do freguês, geralmente em que o ouvinte é a personagem principal. Daquelas que leva os netos para a cozinha e deixa eles colocarem a mão na massa pra fazer bolinho de chuva e espalhar farinha pela cozinha toda.
    A vida toda alimentei o sonho de ser professora oficial, pois extraoficialmente sempre fui. E agora, às vésperas da aposentadoria sinto uma angústia ao ter que encarar a sala de aula de uma escola odiada pelos alunos (que deveriam ser nosso principal objetivo), de uma escola que se transformou numa cadeia (foi necessário até criar leis e benefícios para que cessasse a evasão), uma escola que poda os alunos, que corta suas asas e não os deixa voar. E não só os alunos se veem podados, os professores também. De repente me sinto a mais incompetente profissional, eu que tenho um histórico de recuperação de alunos, descobri que já não sei ensinar. Minha sabedoria foi cruelmente amputada pela escola.
    Portanto, não posso deixar de apoiar a Penélope e família em sua busca por tentar acertar. Eu também gostaria de fazê-lo. Isso não quer dizer que eles vão acertar, mas é preciso ter a coragem de tentar e lutar por uma vida mais humanizada.

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  2. Tou chorando aqui Penélope...
    Que lindo esse processo, que duro, que forte.
    Não só pela coisa da desescolarização, mas pelo processo mesmo, pela sua percepção das coisas, a coragem da decisão, o tomar consciência do que realmente importa!
    vc ainda faz terapia? Com quem?

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  3. Emocionada com o comentário da sua mãe!
    Que maravilha ter o apoio dela tão intensamente. Não é um "é a sua vida, vc faz o que quer". É um "estou com vc porque acredito na sua luta". Lindo.

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  4. Pê, não tenho palavras pra expressar como isso ecoa em mim. Tardiamente, é fato, porque a Mariana tem 14 anos. Sua dor é a mesma que sinto todas as vezes que deixo minha menina em casa pra vir trabalhar e chego em casa esgotada e sem tempo pra fazer outras coisas que não seja trabalhar mais. Já havia decidido vender o apartamento e mudar de vida. Seu blog só fez confirmar as minhas intuições.

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